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© o escrivão

histórias em capítulos diários de segunda a sexta-feira.

© o escrivão

histórias em capítulos diários de segunda a sexta-feira.

24.02.21

Mil Caras

 

(conto #10)

o protector acorda e silenciosamente prepara o pequeno-almoço num tabuleiro para levar à enfermeira. a casa cheira a café acabado de fazer. descalço dirige-se até ao quarto da sua protegida e acorda-a de mansinho. tenta falar, diz-lhe, para ter a certeza que não vais vomitar o pequeno-almoço. ela diz: bom dia, amigo. e sorri. o sono profundo que o sedativo lhe proporcionou teve um efeito calmante. a enfermeira só não consegue conter as lágrimas. já falamos, quando a tradutora acordar. precisas de reforçar o corpo, toma o pequeno-almoço, sossega-a o protector. ajuda-a a sentar-se na cama, colocando almofadas a servir de apoio e senta-se de lado a vê-la comer. depois de se certificar que ela está a recuperar as forças, vai pôr lenha na lareira. a tradutora ressona baixinho, divertido regressa para o quarto da enfermeira. queres comer mais alguma coisa, pergunta-lhe. as lágrimas escorrem-lhe pelo rosto incontroláveis e ela diz, por favor traz-me a minha mala de domicílios, preciso de um calmante. com medo que as convulsões regressem ele corre a atender-lhe o pedido e, com a pressa, acaba por acordar a tradutora.

(continua)

23.02.21

Mil Caras

 

(conto #9)

mas afinal és espia ou não? pergunta desconfiado. era! exclama a tradutora. até ser acusada de traidora pelo meu país. a partir daí sou uma mulher a tentar ser livre. o protector cofia a barba, descalça-se e começa a andar em círculos pela casa. ela descalça-se e regressa ao aconchego da lareira. há que dar tempo, afinal este homem tem a sua vida nas mãos. vai fazendo exercícios de respiração para se manter calma, a espera pode ser longa. o protector decide: vamos esperar que a enfermeira acorde, para termos esta conversa. deita-se no sofá e adormece de exaustão. com um sorriso divertido nos olhos, a tradutora abre o livro que estava a ler e mantém a lareira acesa. gostava de ter sido gata. a noite chega de mansinho e também ela sucumbe ao sono, enroscada na poltrona. só há brasas quando amanhece. a luz do dia entra pelas janelas da sala. o protector acorda e silenciosamente prepara o pequeno-almoço num tabuleiro para levar à enfermeira. a casa cheira a café acabado de fazer.

(continua)

22.02.21

Mil Caras

 

(conto #8)

estão agora os dois a olhar para a enfermeira sem saber o que fazer para a acalmar. ela deve ter calmantes em casa! vê no armário da casa-de-banho e eu vou ver no quarto, diz a tradutora. ambos vêem a mala de domicílios à porta de casa. entregam-lha. a enfermeira tira uma seringa, encaixa uma das agulhas esterilizadas e procura o sedativo, prepara tudo e deixa-os tratar do resto. em poucos minutos está a dormir. levam-na para a cama, fecham as cortinas e vão para a cozinha, a divisão mais distante do quarto. aí o protector levanta um sobrolho e sussurra: de que lado do muro estás tu? a tradutora respira fundo e confessa: fui traída no meu país e acusada de comunista, aqui estou na corda bamba. há quem desconfie que sou espia e como sou americana estou em perigo. mas afinal és espia ou não? pergunta desconfiado. era! exclama a tradutora. até ser acusada de traidora pelo meu país. a partir daí sou uma mulher a tentar ser livre.

(continua)

21.02.21

Mil Caras

 

(conto #7)

a enfermeira olha para o protector e ambos têm o mesmo pensamento em simultâneo. para mim nada é ultra-secreto, revela a tradutora, tenho os códigos todos aqui, e aponta para a cabeça. mas a enfermeira murmura: e nós ajudámo-lo! e tem uma convulsão como se fosse vomitar. o protector grita: NÃO, NÃO, NÃO! e esbraceja dando murros na própria cabeça. a tradutora receia ter-se denunciado na altura errada e perde a cor. quem os visse internava-os. há quem os esteja a ver e a rir à gargalhada. estão os três em pânico. trémula, a tradutora levanta-se e serve-se de um uísque que bebe de um trago. serve-se de outro e mais outro e então indaga: mas o que é que se passa com vocês? a enfermeira, sempre que tenta falar, tem uma convulsão. o protector está rubro pela violência com que se agride. levanta-se e a tradutora estende-lhe um uísque. obrigado, diz ele, rouco de tanto gritar. estão agora os dois a olhar para a enfermeira sem saber o que fazer para a acalmar.

(continua)

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